A situação na agricultura<br>e a luta dos agricultores

José Miguel Fernandes (Membro da Direcção da Organização Regional
de Vila Real)

A Agri­cul­tura é uma ac­ti­vi­dade sem a qual a vida não sub­siste, que à se­me­lhança de ou­tras ac­ti­vi­dades tem di­fi­cul­dade em re­sistir à fúria do ca­pi­ta­lismo onde im­pera a ex­plo­ração do Homem pelo Homem e se abusa dos ani­mais (ex­plo­ra­ções in­ten­sivas) e das plantas (os trans­gé­nicos), com o ob­jec­tivo do lucro, sem haver a pre­o­cu­pação das con­sequên­cias ne­fastas que daí advêm, como a po­luição, a to­xi­dade dos ali­mentos, o es­go­ta­mento dos solos.

Ao con­trário do que era ne­ces­sário, foram estes os si­nais em que a Re­forma da PAC 2014-2020 in­sistiu. A pro­tecção dos mesmos de sempre. Os grandes agrá­rios e os se­nhores do agro-ne­gócio, que detêm a terra, sem obri­gação de a pôr a pro­duzir. As ex­plo­ra­ções in­ten­sivas e super-in­ten­sivas. Os sete por cento que re­cebem 80 por cento de todas as ajudas co­mu­ni­tá­rias, numa dis­torção que é um es­cân­dalo.

Do outro lado temos a agri­cul­tura fa­mi­liar, uma agri­cul­tura sus­ten­tável, à qual a ONU re­co­nheceu im­por­tância eco­nó­mica, so­cial, am­bi­ental e cul­tural, de­cla­rando 2014 Ano In­ter­na­ci­onal da Agri­cul­tura Fa­mi­liar. É este tipo de agri­cul­tura, que ali­menta mais de 70 por cento da po­pu­lação com apenas 30 por cento da terra arável, a que mais mar­gi­na­li­zada tem sido em todos os acordos in­ter­na­ci­o­nais e pelas su­ces­sivas PAC e pelos go­vernos que com po­lí­ticas de classe, de­sas­trosas para a agri­cul­tura, le­varam ao en­cer­ra­mento de mi­lhares de ex­plo­ra­ções agrí­colas.

O caso mais evi­dente é o sector lei­teiro, no qual o nú­mero de pro­du­tores di­mi­nuiu em mais de 90 por cento, com a des­re­gu­lação dos mer­cados e o fim das quotas lei­teiras, para fa­vo­recer o au­mento da pro­dução no centro e Norte da Eu­ropa. Pro­dução em que o País é au­to­su­fi­ci­ente mas que pode estar con­de­nada, a não ser as­se­gu­rado um pa­ga­mento justo aos pro­du­tores e re­posto um sis­tema de quotas.

Preço justo e es­co­a­mento são as prin­ci­pais ques­tões para as­se­gurar os ren­di­mentos da pe­quena e média agri­cul­tura, o que exige uma firme in­ter­venção do Go­verno para fazer face à di­ta­dura da grande dis­tri­buição que impõe preços, es­ma­gando os pro­du­tores!

A pe­quena e média agri­cul­tura en­frentou, com o go­verno PSD/​CDS, uma das mais bru­tais ofen­sivas:

  • Pe­na­li­zação fiscal dos pe­quenos agri­cul­tores, com a obri­gação da sua ins­crição nas Fi­nanças;

  • Al­te­ração à lei dos Bal­dios, pro­cu­rando as­saltar a pro­pri­e­dade co­mu­ni­tária de uso múl­tiplo, que são a terra de quem a não tem;

  • Al­te­ração às re­gras da ar­bo­ri­zação, com vistas a uma maior eu­ca­lip­ti­zação do ter­ri­tório;

  • En­trega da Casa do Douro aos grandes in­te­resses do co­mércio e das casas ex­por­ta­doras.

Não de­sis­timos da luta

A agri­cul­tura fa­mi­liar, or­ga­ni­zada pela CNA e as­so­ci­adas, em uni­dade com ou­tras or­ga­ni­za­ções, res­pondeu com a luta. De Norte a Sul do país, mi­lhares de agri­cul­tores saíram à rua, de­sig­na­da­mente em Braga, em Ma­to­si­nhos, em Lisboa, no Douro ou em Aveiro.

A Con­fe­de­ração Na­ci­onal da Agri­cul­tura que re­a­lizou o seu 7.º Con­gresso, a maior ini­ci­a­tiva em Por­tugal no âm­bito do Ano In­ter­na­ci­onal da Agri­cul­tura Fa­mi­liar, com mais de dois mil agri­cul­tores, que apro­varam a Carta e o Es­ta­tuto da Agri­cul­tura Fa­mi­liar.

O nosso Par­tido já levou este Es­ta­tuto à As­sem­bleia da Re­pú­blica, que foi chum­bado pelo PSD, pelo CDS, mas também pelo PS, que também na área da agri­cul­tura, como se afirma nas Teses, não al­terou a sua na­tu­reza e os seus prin­cí­pios e a sua sub­missão aos man­dantes da União Eu­ro­peia.

Pouco dias de­pois da apro­vação do Or­ça­mento do Es­tado para 2017, que­remos va­lo­rizar as pro­postas do nosso Par­tido apro­vadas, de re­dução de três cên­timos no preço do Ga­sóleo Agrí­cola para pe­quenos e mé­dios agri­cul­tores e Isenção de custas nas ser­vi­dões dos ter­renos agrí­colas para as es­tradas na­ci­o­nais.

Pro­postas apre­sen­tadas cum­prindo o prin­cípio de não des­per­diçar ne­nhuma opor­tu­ni­dade para repor e con­quistar di­reitos. Valeu a pena!

A vida de quem tra­balha a terra nunca foi fácil e as di­fi­cul­dades não nos farão de­sistir da luta pelo justo re­co­nhe­ci­mento e re­tri­buição do nosso tra­balho para for­necer uma ali­men­tação sau­dável ao povo por­tu­guês!

Contra o agro-ne­gócio ca­pi­ta­lista da in­dús­tria e da dis­tri­buição in­ter­na­ci­o­nais e as po­lí­ticas que os su­portam, lu­tamos pelo di­reito à terra e a pro­duzir!

Aos co­mu­nistas está co­lo­cada a exi­gência de pros­se­guir o con­tacto e a li­gação com o cam­pe­si­nato, ali­ados pre­fe­ren­ciais da classe ope­rária, con­tri­buir para a uni­dade do mo­vi­mento e para o de­sen­vol­vi­mento da luta, até porque novos pe­rigos se avi­zi­nham, como os acordos TTIP e CETA, que é ne­ces­sário der­rotar, ou as fu­turas al­te­ra­ções à PAC!

Assim fa­remos!

 



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